CHIARA
Hoje eu estava no meu limite com o Morcegão e as ameaças dele, que vive dizendo que eu tenho um target na cabeça, é só apertar o gatilho que eu vou embora. Então eu chamei a Chiara pra uma conversa de mulher pra mulher. Tudo o que eu pedi pra ela foi que o Morcegão não tocasse mais em mim. Pode parecer um grande fiasco, e talvez seja, mas eu não vejo ele pegando na cintura da russa, muito menos se encostando por trás dela atrás do balcão.
Como eu já estou cansada desse papo de brasileiro é assim e não sei o que é assado, eu resolvi pelo menos tentar colocar um fim nesse terrorismo. Ela disse que entende, que viu o dia que ele botou a mão dentro da minha blusa pra arrumar o meu lenço, e eu disse pra ele que eu arrumava sozinha, que eu não queria que ele visse meus peitos. Ele disse que já tinha visto muitos na vida, e quando eu lembrei essa estória pra ela, ela disse que ele estava brincando.
Eu disse pra ela que todo dia ele me ameaça dar um warning, que eu vivo chorando pelos cantos e ando tendo problemas pra dormir – e eu tenho mesmo, quando estou muito estressada, não consigo dormir. Ela disse que ia falar com ele, e eu não sei o que ela fez, mas ele não bota mais a mão em mim, graças a Deus.
Ela disse que PARECE que eu não estou nem aí pro meu trabalho, e eu disse que pode até parecer porque eu cansei de tentar demonstrar, mas que eu faço meu melhor. E ela deve ter acreditado, porque eu não tive UMA reclamação sobre nenhum tipo de foto que eu faço. Nessas duas semanas dela a bordo, pra mim ela só choveu no molhado, porque tudo o que ela disse sobre enquadramento e configuração de câmera, o Sérgio e a Gi já tinham me ensinado há muito tempo atrás. Claro que eu não consigo mais sorrir pra todos os passageiros, mas eu ainda me esforço, só não sei porque... No fim das contas, por aqui, quando tu faz direito é o mínimo, e quando tu faz o que tem que fazer sem se rasgar pra fazer mais, está errado.
MORCEGÃO
Nesses tempos de inspetora a bordo ele anda mais doente do que o normal. Eu, que já ando cansada de terrorismo, chamei ele pra uma conversa de 30 minutos que eu gravei com o câmera no bolso. Não sei o que eu queria provar, mas estava desesperada, querendo fazer alguma coisa. Tem dias que eu penso em processar essa empresa, tem dias que eu me dou conta de que ninguém me obriga a estar aqui. E eu sigo oscilando entre ser pioneira e procurar meus direitos e/ou fazer como tudo mundo e esperar meu contrato acabar.
EU SOU UM PROBLEMA
Já sabia que o mais difícil de vir pra cá ia ser controlar minha personalidade. Eu nunca fui uma pessoa conformada nem a líder da turma, sempre fui a questionadora e a líder da gincana, do motim, do ônibus da torcida organizada. Mas o mundo já deu muitas voltas, me sustento há muitos anos, e tive que engolir muitos mais sapos do que estava acostumada depois que meu pai morreu. Tem dias que eu desejo ser uma mosca morta, uma dessas pessoas que se conforma e espera o tempo passar. Mas eu ENXERGO muito bem as coisas acontecendo ao meu redor, pra mim e pros outros, e é quase impossível eu não me revoltar com coisas como o café da tarde com meia dúzia de pãezinhos que servem pra 1.200 tripulantes esfomeados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Me comenta...