O que eu escrevi ultimamente, a depressão, foi no fim do trabalho de hoje. Quando vi no programa que não tinha que acordar cedo, fui pro crew bar reclamar da vida com uns conhecidos. Comprei uma garrafa de vinho e fiquei até às 5 da manhã sentada no banheiro escrevendo e chorando. Esse navio vai afundar de tanta lágrima. Mas aqui pai de família chora, e eu, que sou beeeem passional, choro como arroz.
10/8 PALERMO – DIA DO FICO
Acordei em crise, ainda bêbada, pra receber meu salário. Todo mundo sabe que recebi 150 euros, agora vou explicar porquê. Meu salário base é 775, daí descontam 100 do crew pass, 20 do “auxílio” médico e mais 120 que é tipo uma poupança ou garantia. Se eu terminar meu contrato eles me devolvem todo dinheiro, se eu quebrar o contrato eles usam o dinheiro pra me despachar pro Brasil. Como eu tive que dar um talagasso grande pra começar a pagar meu cartão, pedi um adianto de 460 euros. Sobrou essa mixaria.
Revoltadíssima, fui pra internet decidida a ir me embora de qualquer jeito. Liguei pra minha mãe e nós falamos mais de uma hora. Tudo o que eu queria ouvir era “volta pra casa filhinha”, mas ela me disse o que eu precisava ouvir. A vida tá difícil pra todo mundo em qualquer lugar, e embora num navio tudo seja elevado a milésima potência, eu tenho um emprego, moro num navio de luxo, e sim, estou ganhando mais do que no Brasil e até o fim do meu contrato eu vou ter uma graninha pra mim.
Fazia muito tempo que eu não dizia eu te amo pra minha mãe, e eu resolvi não deixar pra amanhã – até porque o amanhã é na Tunisia... pra mim. Eu amo minha mãe, com todas nossas diferenças, com todas as revoltas da adolescência. Só que eu não sou mais adolê nem minha mãe está em menopausa. E eu resolvi aceitar ela como ela é, e lembrei das palavras do meu sábio pai... “Tu tem que dar uma chance pra tua mãe, um dia vocês vão precisar uma da outra”. Ele também me lembrou muitas vezes de como ela teve uma vida difícil, de como ela era inteligente e que ela tinha um dos melhores textos do Estado. Ele dizia que eu era uma privilegiada de nascer numa casa onde tinham 5 jornais pra ler, e que eu não era talentosa pra escrever só por ter pais jornalistas ou só por ter incentivo pra ler, que me era um dom natural e eu ia usar isso uma hora.
Quem não me conhece pessoalmente, ou quem não conheceu meu pai, já deve estar cansado de todo esse momento coração. Mas quem conheceu ele sabe que ele tinha o maior coração do mundo, sabe o quanto ele era importante pra mim, e sabe como o meu mundo caiu quando ele morreu de uma hora pra outra e eu morava em Salvador.
Então ao invés de me deprimir, resolvi lembrar das coisas que ninguém sabe, e assim encontrei a força pra ficar aqui. Na última vez que o vi, quando ele foi me visitar na Bahia, ele me disse, entre outras coisas...
“Tu vai fazer coisas que nenhuma das tuas irmãs vai fazer. Agora tu está em Salvador, mas isso é só um começo. Tu vai ir pra Europa, vai conhecer o mundo”. Ele também me chamava de professorinha muito antes de eu começar a dar aula de inglês... E é por essas e por outras que eu não tenho vergonha nenhuma de dizer: eu ainda converso com meu pai, sei que ele vive em mim. Eu vou pro mar e peço força pra ele, porque o último banho de mar dele foi comigo, na Praia do Forte. Eu sei que ele está vendo minha luta e o meu esforço pra fazer as coisas que eu sempre quis fazer: viajar, conhecer pessoas, fotografar, falar inglês todo dia. E quando eu chego em Barcelona, já sem esperanças nessa vida de trabalho, e começo a ver placas PAI em todos os lugares, eu renovo minha fé. A fé que eu tenho em mim mesma, a fé em Deus que eu TINHA perdido quando ele morreu.
E eu fiquei feliz de ter chegado tão longe pra perceber o quanto minha mãe é importante pra mim, que minhas irmãs são muito mais que meninas super poderosas, que Deus mandou o Bernardo pras nossas vidas pra gente não perder a vontade de viver sem o pai. E eu digo pra todo mundo que acha minhas estrelas lindas...
UMA ESTRELA PRA CADA UM DA MINHA FAMÍLIA: PAI, MÃE, MINHAS QUATRO IRMÃS E EU.
Eu estou chorando sim, de orgulho de fazer parte de um clã de mulheres guerreiras, e se alguma de vocês estiver aí, quero que saibam:
MÃE, GRAÇA, ANA, BELA, INÊS: EU AMO MUITO TODAS VOCÊS.
AIN CHOREI AGORA DE DAR DOR NA GARGANTA QUE LINDO PARABENS FORCA SEMPRE MENINA...
ResponderExcluirBEIJOS ELAINE SANTOS SP
Gatinha:
ResponderExcluirSomos quem somos pelo nosso pai, cada uma com suas peculiaridades, mas TODAS com o caráter dele. Nosso anjo gordo está sempre entre nós, sinto isso.
Sorte de apenas cinco mulheres que viveram intensamente o amor e a cumplicidade paterna, isso é Deus.
TE AMO MUITO. BEIJOS!
eu nem digo nada. tu disse tudo. amor, Bela.
ResponderExcluirOBRIGADA A TODOS PELA FORçA E APOIO.
ResponderExcluirEH MUITO IMPORTANTE CONTAR COM O APOIO DE VOCES
ONTEM COMPLETEI 6 MESES A BORDO, AGORA SAO SOH MAIS DOIS... MAS ESTOU FELIZ DE ESTAR AQUI, APESAR DAS MUITAS DIFICULDADES, EXISTEM MUITAS PESSOAS ESPECIAIS NO MEU CAMINHO.
GRANDE BEIJO